Vamos falar sobre transfobia?

O meu lugar é onde eu desejar, o seu preconceito não define quem eu sou e nem o que quero alcançar!
“Sexo é biológico, gênero é social, construído pelas diferentes culturas. E o gênero vai além do sexo: O que importa, na definição do que é ser homem ou mulher, não são os cromossomos ou a conformação genital, mas a auto-percepção e a forma como a pessoa se expressa socialmente.” Jaqueline Gomes de Jesus, 2012
Se ao nascer, alguém é reconhecido biologicamente como pertencente ao sexo masculino e, ao longo de sua vida, há a aceitação dessa identidade também como gênero, isso se traduz no termo cis. Mas se a pessoa não vive em conformidade entre o seu sexo biológico designado ao nascer com o gênero com o qual ela se percebe, a classificação é a de transgênero, transexual ou simplesmente trans.
Compreender o que é uma pessoa trans é fundamental para o entendimento de alguns comportamentos preconceituosos reconhecidos como transfobia e que são repassados há gerações.
A transfobia por ser um comportamento nem sempre percebido pela sociedade acaba sendo reforçado através de atitudes observadas por poucas pessoas. É fundamental combater tais práticas para evitar o sofrimento psicológico resultante dessa opressão aos transgêneros.
A população trans, convive diariamente com o preconceito e a discriminação, o que gera um sofrimento e adoecimento constante. A transfobia que são atos de preconceito contra as pessoas que se identificam como transgêneros, é algo internalizado e muitas vezes institucionalizado, bem como as violências físicas e simbólicas. O trabalho para a eliminação do preconceito, a exclusão, a opressão e a discriminação deve ser contínuo. Existem duas importantes questões para que isso seja feito: o acolhimento e o fortalecimento das pessoas trans.
É fundamental para o combate da transfobia conhecer alguns motivos que a sustentam. Nesse texto vamos trabalhar com quatro colunas muito utilizadas nos discursos de ódio e preconceito. A primeira coluna que alimenta o preconceito é a “heteronormatividade”, cultura que valoriza como aceitáveis somente os relacionamentos heteroafetivos. Esse pensamento transfóbico exclui, por completo, identidades de gênero diferentes da feminina e masculina (cisgêneros) e também todas as demais orientações sexuais.
A segunda coluna muito utilizada como justificativa para a transfobia são questões religiosas. Para as religiões cristãs, qualquer relação que extrapole a homem-mulher, é considerada um desvio de conduta ou ato pecaminoso. Com isso, quando há manifestação de comportamentos contrários aos estereótipos “comuns” de masculino e feminino, aflora-se a discriminação e o preconceito mimetizados pela visão religiosa. Contudo, há um princípio básico: ao se utilizar a religião como justificativa ao preconceito, ignora-se o amor ao próximo.
A terceira coluna é a falta de conhecimento, a desinformação e repetição de terminologias ou ações do senso comum que perpetuam os comportamentos transfóbicos.
A quarta coluna advém do patriarcado e relações de poder instituídos ao longo da história da humanidade. Algumas interpretações decorrentes dessa construção social trazem ainda mais invisibilidade e vulnerabilidade para as pessoas trans. É o caso da corrente feminista radical que não reconhece a transexualidade por não aceitar o conceito de gênero. Ou seja, não entende que uma mulher trans seja uma mulher e possa estar inserida nos movimentos feministas. Da mesma forma, não reconhece que um homem trans seja um homem.
Essas quatro colunas são utilizadas de forma individual ou coletiva para que os transgêneros permaneçam à margem do convívio social incentivando as mais diversas violências.
A transição de gênero é uma fase repleta de medos e anseios que não estão associados apenas às mudanças que os tratamentos hormonais trazem. Ela é repleta de obstáculos e desafios pessoais impostos pela sociedade. A maioria das pessoas nessa fase sofre com a rejeição ligada ao campo afetivo nas relações com pais, filhos e parceiros amorosos de antes da transição.
É importante ressaltar que as atitudes preconceituosas, a falta de respeito e apoio levam as pessoas trans há um sofrimento mental intenso, que muitas vezes se desencadeia ao auto extermínio. Com isso, é necessária uma rede de apoio, seja ela familiar, de uma família estendida, de equipamentos públicos ou da sociedade civil. Com esse objetivo, unimos a vontade de fazer a diferença, bem como queremos mostrar que apesar de uma estrada com vários empecilhos, pedras e abismos, existe a possibilidade de construir caminhos reais e possíveis.
Referências Bibliográficas
Conselho Federal de Psicologia (2021). NOTA TÉCNICA Nº 1/2021/GTEC/CG. Brasília, CFP. Disponível em: https://site.cfp.org.br/documentos/nota-tecnica-no-1-2021-gtec-cg/. Visualizado em 10/08/2021
Jesus, Jaqueline Gomes de. Orientações sobre identidade de gênero : conceitos e termos / Jaqueline Gomes de Jesus. Brasília, 2012. Disponível em: http://www.diversidadesexual.com.br/wpcontent/uploads/2013/04/G%C3%8ANERO-CONCEITOS-E-TERMOS.pdf Visualizado em 10/08/2021
MASSAROLO, Myrian. Rompendo Preconceitos. São Paulo:Fundação JK,2013.
MELLO, Luiz. NOVAS FAMILIAS: Conjugalidade homossexual no Brasil Contemporaneo. Rio de Janeiro: Garamond, 2005.
HANNAH MCCANN...[et al.], O Livro do Feminismo,1ª edição, Rio de Janeiro, Globo Livros, 2019. Referências suportando a 4ª. Coluna do texto nas pags 172 e 173 em que as feministas Janice Raymond, Sheila Jeffreys e Germaine Greer associam a condição da mulher transgênero à doenças mentais defendendo não existirem razões autênticas para uma transição relacionando a condição de gênero apenas à genitália de nascença.
Para conhecer sobre Transfeminismo, recomendamos ler “O Manifesto Transfeminista” de Emi Koyama de 2001 e “Whipping Girl” de Julia Serrano de 2007.